sexta-feira, 19 de dezembro de 2014

Alguém que, com o acontecimento, sonha

Alguém que, com um acontecimento, sonha

Fico pensando
O quanto faria sem essas intermináveis cicatrizes.

Silencio-me no unguento das folhas de dente-de-leão para afagar a ferida.
Faço, do cataplasma, um prato gourmet.
Deito-me num leito estreito onde toda minha dificuldade afunda.

Escrevo porque sinto [somente a palavra me suspende]
Então consigo sumir.
Ir sumindo.

Espero que o dia passe.
Repasso a minha vontade.
O jugo de sempre, os desperdícios involuntários, os exercícios da inaptidão.

Sinto o peso de não ter peso.
Sinto vergonha e revolta.
Sinto vergonha por sentir revolta e vergonha.
Sinto que não há volta, não há retorno.

Em torno de mim a jornada se apaga com o sol posto.
A lua beija o meu sono e as estrelas consomem meu cansaço.
E esse braço, e esses sonhos todos que criei,
Não morrerão antes que as minhas mãos os afaguem.
Antes que meus olhares sejam totais.

Acredito e evito enlouquecer.
Sinto pena do que poderia ter sido.
Sinto pena do que poderia ser.
Sinto o que é.

Sinto com a proscrição, por saber que, de algum modo,
Tudo será, e tudo terá sido.
Assustadoramente belo [Como eu sem mim]
Num sem tempo [Talvez]
Noutro tempo que não esse.

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